A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou na tarde de ontem, por 37 votos contra 14, o Projeto de Lei 5069/13, de autoria do presidente da Casa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), que estabelece penas específicas para quem induzir ou orientar gestantes ao aborto, com agravamento de pena para profissionais da saúde. Na prática, a lei também dificulta o acesso ao aborto legal. O projeto modifica a Lei de Atendimento às Vítimas de Violência Sexual (Lei 12.845/13) e segue para ser votado em Plenário da Câmara.

A violência é caracterizada como o uso intencional da força física ou do poder, real ou em ameaça, contra si próprio, contra outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha grande possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência de desenvolvimento ou privação.

Já a violência de gênero é qualquer ação ou conduta baseada no gênero, que cause dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado. E, tal violência tem sua origem na discriminação histórica contra as mulheres, e isto, justifica e sustenta os atos violentos.

E, a violência sexual é definida como qualquer ato, sexual ou contra os princípios de pudor de uma pessoa, imposto sob ameaça, sem seu consentimento inteligente e/ou responsável, com intenção de obter satisfação sexual para o agressor e/ou humilhação da vítima.

No segundo semestre de 2009, foi aprovada a Lei nº 12.015 (07 de Agosto de 2009), que altera o Título VI da Parte Especial do Decreto – Lei nº 2.848, de 7 de Dezembro de 1940 – Código Penal, e o art. 1º da Lei nº 8.072, de 25 de Julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos (estupro), nos termos do inciso XLIII do art. 5º da Constituição Federal.

Como resultado, qualquer forma de coito (vaginal, anal, oral ou manipulação) passa a ser considerado estupro se forem contra o consentimento inteligente e responsável da vítima. Outra mudança relevante é que o estupro de menores de 14 anos, deficiente mental grave ou qualquer pessoa fora de juízo normal (efeito de drogas, sedação, etc.) passa a ser considerado como estupro de vulnerável, existindo um acréscimo de pena nessas situações.

Dados Epidemiológicos:

  • 12 milhões de pessoas sofrem violência sexual no mundo, a cada ano.
    • FRANÇA: 25 mil mulheres (estupro) a cada ano.
    • ÁFRICA DO SUL: 147 mulheres são estupradas por dia.
    • COSTA RICA: 67% das mulheres com mais de 15 anos já sofreram violência física ou sexual.
    • MÉXICO: 33% das mulheres com mais de 15 anos já sofreram violência sexual.
  • Prevalência do sexo feminino (85% a 90%) e faixa etária dos 15 aos 44 anos.
  • Predominância entre adolescentes e jovens adultas.
  • 80% a 95% não são denunciados (Motivos: medo de denunciar; medo do interrogatório policial; pavor do exame de corpo de delito – IML; perda da confidencialidade; vingança do agressor; não ser acreditada e ser julgada; discriminação; prejuízo; abuso de poder em relação à mulher; e humilhação.

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  •  BRASIL
    • 1 a cada 4 mulheres já sofreram violência em algum momento de suas vidas;
    • No ano de 2011, foram atendidas um valor acima de 13 mil mulheres vítimas de violência sexual;
    • Central de Atendimento à Mulher (Disque 180) – 98.326 casos de violência entre 2006 e 2009:
      • 314: Violência Física;
      • 688: Violência Psicológica;
      • 624: Violência Moral;
      • 785: VIOLÊNCIA SEXUAL;
      • 428: Violência Patrimonial

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  • O número de estupros no Brasil aumentou 19,3% em 2012, em comparação com o ano anterior:
    • 2011: 42,4 mil casos (5 a cada hora);
    • 2012: 50,6 mil casos (6 a cada hora).

  • Em todo o país, foram registrados 50,6 mil casos, que corresponde a 26,1/100 mil habitantes. Em 2011, a taxa era de 22,1;

  • O total de estupros (50,6 mil casos) superou o de homicídios dolosos no país, onde foram registradas 47,1 mil mortes.

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  • Um estudo realizado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) em 2005, em 18 países revelou que UM TERÇO das jovens manteve sua primeira relação sexual de maneira FORÇADA ou COERCITIVA;
  • E uma pesquisa desenvolvida pelo Laboratório de Estudos da Criança do Instituto de Psicologia da Universidade de São Paulo (LACRI) em 26 estados brasileiros, revelou que de 1996 a 2006 foram registrados:
    • 754 casos de violência contra crianças:
      • 40,70%: Negligência;
      • 31,40%: Violência Física,
      • 16,40%: Violência Psíquica; e
      • 11,10%: Violência Sexual (o estudo evidenciou ainda que dos 16.849 casos de violência sexual registrados no período, 75,50% foram praticados contra crianças e adolescentes do sexo feminino).
  • Pelos registros do SINAN (Sistema de Informação de Agravos de Notificação) foi atendido, em 2011, um total de 10.425 crianças e adolescentes vítimas de VIOLÊNCIA SEXUAL:
    • A maioria do sexo feminino: 83,2% e com pouca oscilação entre as faixas etárias;
    • Entre os 15 e os 19 anos: os índices femininos atingiram 93,8%;
    • Ao todo, foram 16,4 atendimentos para cada 100 mil crianças e adolescentes;
    • A maior incidência de atendimentos foi na faixa etária de 10 a 14 anos, com uma taxa de 23,8 notificações para cada 100;
    • Os agressores geralmente são o pai, avô, irmão/ primo, padrasto, agressores conhecidos e desconhecidos.

Gestação decorrente de Violência Sexual

ALTERNATIVAS:

1) Continuidade da Gestação: garantia de cuidados pré-natais apropriados (atendimento multiprofissional). Após o nascimento da criança, duas alternativas:

  1. a) Permanecer com a criança;
  2. b) Encaminhamento da criança para adoção através dos trâmites legais.

2) Interrupção Legal da Gestação: diante da solicitação de interrupção da gestação, a decisão é da Equipe Multiprofissional, considerando os parâmetros técnicos e legais cabíveis.

            A Portaria GM MS 1.508, de 01.09.2005, publicada no DOU de 02.09.2005, dispõe sobre o procedimento de justificação e autorização da interrupção da gestação nos casos previstos na lei do Sistema Único de Saúde. Além de, considerar a legislação como garantia jurídica e estabelecer os passos para o profissional de saúde e, amparar a mulher em sua necessidade e DIREITO ao procedimento.

Abortamento:

Para o conceito médico, abortamento é a interrupção do processo gestacional até a 20ª ou 22ª semana de gravidez, dês que o produto da concepção pese, pelo menos, 500 gramas. A partir dessa idade gestacional, fala-se em “antecipação do parto”.

Mas, para o conceito jurídico-penal, abortamento é a conduta de interrupção da gestação, a qualquer tempo, antes de seu termo final, dolosamente, causando a morte fetal. Esse conceito decorre da descrição da conduta do aborto no Código Penal (tipificação).

O abortamento nos casos previstos em Lei é um procedimento lícito e NÃO se pune o médico (Código Penal Brasileiro, artigo 128, do Decreto-Lei nº 2848, de 7 de Dezembro de 1940):

  1. Se não há outra maneira de salvar a vida da gestante – NECESSÁRIO;
  2. Se a gestação resulta de estupro e o abortamento é precedido do consentimento da gestante ou, quando incapaz, do seu representante legal – SENTIMENTAL e;
  3. Malformação incompatível com a vida. Em caso de fetos anencéfalos, comprovados por dois especialistas diferentes, e a solicitação do casal para interrupção a gestação – JURISPRUDÊNCIA.

Documentos exigidos para a interrupção legal da gestação:

ESTUPRO:

  • Solicitação/autorização da paciente e/ou seu representante legal (< de 18 a);
  • O. (Boletim de Ocorrência) e Laudo do I.M.L. (Instituto Médico Legal) não são obrigatórios, embora sejam recomendados e;
  • Exames realizados e a avaliação multiprofissional, que devem ser registrados em prontuário.

Realização da interrupção legal da gestação em crianças, adolescentes e vulneráveis:

Do consentimento para interrupção da gestação:

  • A partir dos 16 e antes dos 18 anos: a adolescente deve ser assistida pelos pais ou por seu representante legal, que se manifestam com ela;
  • Entre 14 e 16 anos: deve-se buscar o consenso entre os pais e a adolescente;
  • Antes de completar 14 anos: a adolescente ou criança deve ser representada pelos pais ou por seu representante legal, que se manifestam por ela, embora todos os esforços devam ser feitos para que haja o consenso entre o desejo da menina e o dos pais.

A violência, como um dos graves problemas de SAÚDE PÚBLICA, pressupõe um trabalho em equipe multiprofissional, em rede, de forma articulada e integrada. As redes de atenção em saúde são formadas por um conjunto de serviços articulados, que realizam desde a atenção primária à saúde até os serviços mais especializados, com o objetivo de garantir a integralidade do cuidado.

CONSIDERANDO:

  • que a violência sexual é crime contra os Direitos Humanos e uma condição de agravo à saúde integral;
  • que a interrupção da gestação nos casos previstos em lei é um direito conquistado e que deve ser garantido pelo Sistema Único de Saúde;
  • as convenções e os acordos internacionais ratificados pelo Brasil;
  • os princípios da Democracia, da Laicidade do Estado, da Igualdade de Gênero e da Dignidade da Pessoa Humana.

É DEVER do Estado e do profissional de saúde oferecer uma assistência qualificada, humanizada e não degradante, mantendo um compromisso ético com a garantia dos direitos das mulheres.

  • Lei nº 12.015, de 07 de Agosto de 2009:
  • Esta Lei altera o Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, e o art. 1º da Lei no 8.072, de 25 de julho de 1990, que dispõe sobre os crimes hediondos, nos termos do inciso XLIII do art. 5º da  Constituição Federal.
  • O Título VI da Parte Especial do Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 – Código Penal, passa a vigorar com as seguintes alterações:
    • TÍTULO VI: DOS CRIMES CONTRA A DIGNIDADE SEXUAL 
    • CAPÍTULO I: DOS CRIMES CONTRA A LIBERDADE SEXUAL

Estupro:

  • 213: Constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso: 
    • Pena: reclusão de 6 a 10
    • Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave ou se a vítima for maior de 14 anos ou menor de 18 anos:
    • Pena: reclusão de 8 a 12
    • Se da conduta resulta morte:
    • Pena: reclusão de 12 a 30 anos.

Violação Sexual Mediante Fraude:

  • 215: Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com alguém, mediante fraude ou outro meio que impeça ou dificulte a livre manifestação de vontade da vítima:
    • Pena: reclusão de 2 a 6 anos.
  • Parágrafo único: Se o crime é cometido com o fim de obter vantagem econômica, aplica-se também multa.
  • A pena é aumentada em até um terço se a vítima for menor de 18 anos.

Estupro de Vulnerável:

       Art. 217-A. Ter conjunção carnal ou praticar outro ato libidinoso com menor de 14 anos:

       Pena – reclusão, de 8 (oito) a 15 (quinze) anos.

  • 1º Incorre na mesma pena quem pratica as ações descritas no caput com alguém que, por enfermidade ou deficiência mental, não tem o necessário discernimento para a prática do ato, ou que, por qualquer outra causa, não pode oferecer resistência.
  • 2º (VETADO)
  • 3º Se da conduta resulta lesão corporal de natureza grave:

       Pena – reclusão, de 10 (dez) a 20 (vinte) anos.

  • 4º Se da conduta resulta morte:

       Pena – reclusão, de 12 (doze) a 30 (trinta) anos.”

Dos Crimes Sexuais Contra Vulneráveis:

  • 218: Induzir alguém menor de 14 anos a satisfazer a lascívia de outrem:
    • Pena: reclusão de 2 a 5 anos.
  • Ação Penal
    • 225: Nos crimes definidos nos Capítulos I e II deste Título, procede-se mediante ação penal pública condicionada à representação.
    • Parágrafo único: Procede-se, entretanto, mediante ação penal pública incondicionada se a vítima for menor de 18 anos ou pessoa vulnerável.

Violação Sexual e Doméstica à Mulher (o marido pode ser autor de estupro contra a própria esposa)

  • A conjunção carnal a força não constitui exercício regular de direito (CP, Art. 23, III, 2ª parte), mas sim, ABUSO DE DIREITO;
  • Portanto, a Lei Civil NÃO autoriza o uso de violência física ou coação moral nas relações sexuais entre os cônjuges.

A relevância em abordar esta temática, que é considerada um grave problema de Saúde Pública, fenômeno universal e destituído de fronteiras:

  • Gravidez: 0,5 a 3%;
  • DST (Doenças Sexualmente Transmissíveis): 16 a 43%;
  • SIDA (Síndrome da Imune Deficiência Adquirida): 1 a 2/1000;
  • Traumas Físicos: 1% assassinadas, 1% traumas graves, 5% traumas moderados, 27% traumas leves;
  • Traumas Psicológicos: Estresse pós-traumático (TEPT), depressão, ansiedade, pânico, distúrbios comportamentais;
  • Repercussões Sociais: abandono da escola, emprego e família, divórcio, pré-natal mal realizado, recém-nascidos abandonados, entre outras.

Fonte E. Cunha: http://goo.gl/ykXhmU

Referências Bibliográficas

  1. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise de Situação de Saúde. Viva: Vigilância de Violências e Acidentes, 2006 e 2007. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2009. 460 p.
  2. ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA. [página da internet]. Pacto de enfrentamento à violência sexual contra mulheres. [acesso em 2015 Out 14]. Disponível em: http://www.forumseguranca.org.br/storage/download//anuario_2013-corrigido.pdf.
  3. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Prevenção e Tratamento dos Agravos Resultantes da Violência Sexual contra Mulheres e Adolescentes: norma técnica. 2ª ed. atual. e ampl. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2012. 73 p.
  4. BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Área Técnica de Saúde da Mulher. Aspectos Jurídicos do Atendimento às Vítimas de Violência – perguntas e respostas para profissionais de saúde. Brasília (DF): Ministério da Saúde; 2005. 23 p.
  5. DREZZET J. Violência Sexual contra a Mulher e Impacto sobre a Saúde Sexual e Reprodutiva. Revista de Psicologia da UNESP. 2003; 2(1): 1-15.
  6. RAIMONDO ML. [tese de mestrado]. Perfil epidemiológico da violência contra a mulher em Guarapuava, Paraná: Contribuições da Enfermagem. Universidade Federal do Paraná; 2010: 93 p.
  7. WAISELFISZ JJ. Mapa da Violência 2012 – Atualização: Homicídio de Mulheres no Brasil. Rio de Janeiro (RJ): FLACSO Brasil. 2012; 27 p.